Novas experiências também perturbam
por Erane Paladino
Quem já não sentiu uma espécie de vazio ao realizar um sonho tão esperado? De repente, aquele projeto colorido, cheio de fantasias e expectativas acaba por perder o brilho quando se concretiza. Por que será?
Esta questão traz em seu substrato uma trama de elementos que permitem uma reflexão abrangente. Como numa espiral, podemos contextualizar essas manifestações a partir dos fenômenos culturais que caracterizam a contemporaneidade. Não fica difícil confundir, nestes tempos, desapontamentos e momentos de tristeza com depressão….A cultura contemporânea tem algumas características peculiares. Como diz Christopher Lasch em seu livro Cultura do Narcisismo os valores sociais envolvem ideais de perfeição e felicidade opressoras. Como ele mesmo diz se “anseia pela ausência do anseio”, algo próximo de uma paz absoluta ou ausência de sofrimento eternas. E o tempo parece “deslocado” da história. Vale o momento e a intensidade substitui o processo e a perspectiva de profundidade. O sociólogo Otavio Ianni reconhece que a “a história acaba substituída pelo efêmero, pela imagem do instante, pelo lugar fugidio. Tudo se dissolve no momento presente, imediatamente superado pela outra imagem, colagem, bricolagem, montagem, mensagem. Privilegia-se o dado imediato”
As mídias sociais reiteram estas considerações; vivemos num mundo onde as imagens sugerem referenciais associados à beleza, alegria, juventude e bem estar. Apesar do apelo comercial subjacente, não é raro estes modelos se transformarem em objetivos de vida. Assim, este milionário sistema de inspiração social, através também de seus representantes, tais como blogueiros e influencers interfere nos valores e induz comportamentos. Com estes paradigmas, onde o virtual quase substitui o real, cria-se um mundo paralelo de ilusão e busca pela satisfação imediata. O mundo das aparências não permite acesso à essência e ao essencial. Também não há espaço para a dor e a frustração se confunde com a ideia de fracasso. Como consequência, estas exigências geram sentimentos de insuficiência e insatisfação diante das experiências. Há uma espécie de desamparo no ar e manifestações de ansiedade parecem constantes.
As expectativas excessivas, o sonho de uma vida perfeita e sem conflitos, desconsidera o caminho a ser trilhado e os revezes como parte do percurso. Diante, portanto, de um novo desafio, alguns sujeitos tendem a manifestações de insegurança diante das incertezas, acabam por desacreditar no projeto, e, consequentemente em si próprios, por esperar resultados rápidos e espetaculares. O francês Guy Debord, nos idos dos anos 60 parecia prever estes novos paradigmas quando escreveu sobre “A Sociedade do Espetáculo”: “ A alienação do espectador em favor do objeto contemplado se expressa assim: quanto mais ele contempla, menos vive; quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes da necessidade, menos compreende sua própria existência e seu próprio desejo”.
O tempo e a história possibilitam as vivências que, a cada dia, colaboram para um sentido mais claro sobre quem somos, o que sentimos e desejamos de verdade. O espaço para a subjetividade e o desenvolvimento interior dependem desta trajetória. O compositor Lenine, inspirado em Oscar Wilde diz que a “a vida é tão rara” e sua beleza está em descobri-la a cada instante. Sua riqueza está presente também no que aprendemos com ela.
Carl Jung diria: Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências, mas nem mesmo percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas e os resultados somente através das experiências.