Durante a última semana, a aprovação de uma proposta legislativa pela Comissão de Agricultura da Câmara abordando o tema dos orgânicos fez bastante barulho nas redes sociais. Com cheiro de fake News (notícias falsas), várias notas de que não conseguiremos mais comprar produtos orgânicos, cultivados sem agrotóxicos, circulou livremente em todos os meios de comunicação.
A preocupação faz sentido, ainda mais depois da aprovação da chamada “PL do Veneno”, outra medida que já discutimos neste espaço e que libera um número maior de agrotóxicos na agricultura brasileira. Como o supermercado é um dos principais pontos de consumo de comida no Brasil, não poder mais achar esses produtos, livres de tanto veneno, com facilidade, causa temores. Pesquisa da Organis (Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável), realizada em 2017, aponta que, para 64% dos consumidores de nove capitais do país, os supermercados são o principal ponto de venda de produtos orgânicos.
Mas, ao contrário de tudo que foi divulgado, a nova lei – que ainda depende de aprovação da CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) e do Senado Federal – fala sobre a venda direta a consumidores realizada especialmente pelos agricultores familiares. É importante lembrar que o famoso slogan “Brasil, maior produtor mundial de alimentos do mundo”, usado pelo agronegócio nacional, não é exatamente verdade. Produzimos muitas commodities: milho, açúcar e, especialmente, soja. Quem produz nossa vagem, batata, tomate, feijão do dia a dia é o pequeno agricultor e não o grande.
Precisamos ficar atentos a esse movimento para continuar a ter direito de escolha, mas é preciso ter informação. Você sabia, por exemplo, que existe a Lei da Agricultura Orgânica, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro de 2003? Nela, a certificação de orgânico é facultativa; o produtor precisa apenas ser cadastrado junto a um órgão fiscalizador e deve assegurar a rastreabilidade de origem daquele alimento. A nova lei pretende justamente determinar que, antes de comercializar seus produtos, o agricultor seja cadastrado junto a um órgão da Administração Pública Federal que regulamenta a produção agrícola e ateste que os produtos seguem mesmo as normas de produção orgânica válidas.
O Ministério da Agricultura é contra o projeto e recomenda em uma nota técnica a não continuidade da proposta por entender que, além de não contribuir com a cadeia produtiva de orgânicos, a PL irá prejudicar o desenvolvimento da atividade. Para a equipe técnica da Coordenação de Agroecologia e Produção Orgânica do Ministério, o texto da lei no molde atual prejudica o acesso aos produtos e dificulta ainda mais a atividade do pequeno produtor.
Lado bom: a certeza de pagarmos mais por um alimento melhor. Se cumprida à risca, a lei garantirá mais pureza nos produtos que consumimos. Mas… como estamos no Brasil, o problema é o de sempre: temos leis excelentes, só não temos capacidade de fiscalizar todo o território imenso do nosso país. Sem um efetivo eficaz de fiscalização, essa nova lei pode ser a oportunidade para os produtores de alimentos não-orgânicos barrarem a venda desses fortes concorrentes, já que a preocupação com o veneno que ingerimos (cerca de 6 litros por ano comendo agricultura convencional) tende a aumentar.
Se aprovado, o texto da nova lei prevê que a comercialização direta de produtos orgânicos aos consumidores possa ser feita exclusivamente por agricultores familiares em propriedades particulares ou feiras livres, itinerantes – aquelas típicas do país – ou permanentes.
Assim, uma boa arma para saber onde encontrar bons produtos e continuar a comer orgânicos é o mapa de Feiras Orgânicas elaborado pelo IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor): https://feirasorganicas.org.br/. Entre neste site, programe suas compras de bons produtos e fique atento às movimentações políticas legislativas em Brasília: em ano de eleição executiva toda nossa atenção acaba se voltando à escolha da (do) presidente da República, quando a eleição Legislativa é mais importante no nosso sistema político atual. Fiquemos atentos.