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Normal é ser diferente!

Desde que eu me tornei cadeirante, em 2001, essa questão de ser normal é presente na minha vida. Praticamente todos os dias eu escuto questionamentos com essa palavra “normal”.

– Você nasceu normal ou nasceu assim? (Respondo em pensamento: “parto normal! ”)

– Você quer voltar a ser normal? (Não costumo sonhar com coisas impossíveis.)

– Quando você era normal…? (Ah! Um dia eu fui? Que legal!)

– Suas irmãs são normais? (Duas doidas!)

– A sua filha nasceu normal? (Cesárea também… )

– E o seu marido, é normal? Ah! Essa eu sempre respondo: “Normal, normal eu não sei, ele é corinthiano, o que você acha? ”

E aí, todo mundo ri e eu aproveito pra explicar que existem pessoas COM deficiência e existem pessoas SEM deficiência e isso não tem nada a ver com normalidade. Afinal, como dizia Caetano: “de perto, ninguém é normal! ”

Brinco com isso, mas de fato, esse pensamento social, não me incomoda, pessoalmente não! Porém socialmente, fico preocupada com a evolução da nossa espécie humana.

Se os filhos aprendem imitando o pensamento e comportamento dos pais, essa evolução será demorada. Quando minha filha tinha uns 7 anos, a diretora da escola me chamou pra conversar sobre deficiência com as crianças da idade da minha. Era uma quadra esportiva e as crianças estavam distribuídas na arquibancada, todas me olhando com aquele dedinho na boca de curiosidade.

Eu comecei e disse 3 frases:

(1) Bom dia! (2) Eu sou mãe da Clara. (3) Vim aqui conversar com vocês sobre ter deficiência.

E pronto! Os dedinhos que estavam na boca levantaram pra cima da cabeça apontando para o céu e eles começaram a fazer perguntas. Eles perguntaram tudo:

– Tia, você dorme sentada na cadeira?

– Tia, como você coloca o sapato?

– Você toma banho, tia?

– É muito difícil andar de cadeira de rodas? Esta um menininho levantou a mão e disse: – Posso responder tia? Eu fiz que sim com a cabeça, daí ele falou: – Eu tenho um irmão cadeirante. No começo é difícil, mas depois a gente acostuma.

Falou e disse garoto! E as perguntas continuaram:

– Como você entra no carro? E eu respondi “Eu faço uma transferência”, – Faz uma pra gente ver, tia?

E a máxima da manhã foi: – Como você faz número um e número dois, tia?

Que manhã maravilhosa, eu nunca vou esquecer o que vivi e senti naquele momento, foram muitas emoções. Tomara que aquelas crianças tenham chegado em casa e dito para os pais que é normal ser cadeirante. Né?!

Quando eu estava indo para o carro, um garotinho me seguiu e me perguntou:

-Tia, você melhorou?

Eu disse: “como assim melhorou?”

– É que minha mãe me disse que você estava dodói.

Aiaiaiaiai!!! “Menino, conta pra sua mãe que deficiência não é doença e se ela tiver mais alguma curiosidade, pede pra ela perguntar pra você, pois hoje você está entendendo muito desse assunto, né?!”

Achar que a pessoa com deficiência não é normal é tão comum quanto achar que ela é dodói. Vamos relembrar quando nós éramos crianças e nos deparamos com um rapaz andando com apoio das muletas, questionamos: “- Papai, por que o moço anda desse jeito? ” O que nosso pai nos respondeu: “Psiu, tá dodói! ” ou “Psiu, não comenta! ” Sendo assim, ficou em nosso inconsciente que pessoas com deficiência são doentes e que com elas não podemos falar. O que é muito, muito, muito triste e equivocado.

Quando convivemos precisamos respeitar, não é mesmo? Agora, como podemos respeitar, pessoas e condições que não conhecemos? E olha que interessante, RESPEITAR significa olhar mais uma vez. Ou seja, não posso respeitar alguém que utiliza muletas para se locomover, se eu só souber isso. É muito importante, saber se ele nasceu ou adquiriu a deficiência, qual é a deficiência dele, há quanto tempo utiliza a ajuda da muleta para caminhar, saber o que ele faz e já fez na vida, saber se ele conhece outras pessoas na mesma condição dele, se ele superou o fato de ter deficiência e se ele sabe qual é a forma mais legal de viver com a condição que ele tem hoje.

Sabe o que vai acontecer depois disso? Essa condição ficará normal pra você, pois sobre ela você não tem mais dúvidas. Você saberá lidar com a pessoa e conseguirá compreender que deficiência é apenas uma característica da pessoa, é mais uma diferença dela. Você vai perceber que normal é ser diferente!

 

 

 

 

 

 

 

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