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Bravura Indômita

O filme BRAVURA INDÔMITA, dos IRMÃOS COHEN, nos ajudará em uma reflexão a respeito dos heróis. Ele faz parte do gênero faroeste. Mas suas personagens apresentam características que possibilitam aproximação com nossos herois atuais. Como isso seria possível?

OS HEROIS E OS MOCINHOS DO FAROESTE

Fomos invadidos pelo mundo dos heróis e super heróis. HQs não me deixam mentir. O cinema tem nesse filão de mercado uma joia sempre lapidada com novidades e efeitos especiais. E todos tivemos um herói preferido, desde muito cedo, companheiro nas fantasias infantis. Difícil ter escapado dessa experiência.

Não será possível explorar o mundo dos heróis que se colocam nas narrativas desde tempos antigos. Citamos apenas alguns dados. Em 1935 o aparecimento do Super Man dá origem a uma geração infindável de heróis alavancados por super poderes neste mundo contemporâneo. São os herdeiros , ops!, a versão moderna dos deuses e semi deuses gregos em versão cada vez mais tecnológica. Sua origem vem de longe.

E continuam pelos terrenos do lúdico, mantendo acesa a chama das narrativas de aventura, permanecendo firmes e fortes porque algo da natureza humana deles necessita. Cumprem uma função dentro de nossas vidas.

Dentro desse universo de tipos fortes e valorosos, o cowboy foi importante. Terá ele semelhanças com os heróis e super-heróis de hoje em dia?

A breve análise de um filme nos ajudará nessa reflexão. Outros do gênero poderão vir à memória. O gênero faroeste segue características que se repetem. O filme escolhido é atual e merece nossa visita. É BRAVURA INDÔMITA (2010, TRUE GRIT) dos irmãos Cohen, com Jeff Bridges e Matt Damon.

E nesse mundo de xerifes, bandidos e personagens solitárias, temos elementos do mundo dos herois? Em que sentido seus “mocinhos” podem ser identificados como tais?

UM PROJETO MOVE O MUNDO

BRAVURA INDÔMITA apresenta os indícios de um filme de faroeste. Há mocinho, bandidos, tiros aos montes, mortes, paisagens imensas, galopes, pó, além de uma cena impagável entre os dois protagonistas (Cogburn e Laboeuf) disputando quem atira melhor no mais puro estilo adolescente. A bravura indomável do típico estilo faroeste, porém, não será medida por essa cena.

Vale a pena desculpar a presença de pequenos fatos improváveis. E pensando bem, eles até podem ser tomados como os “superpoderes” do mundo do faroeste, que aceitamos no puro exercício da imaginação como todos os outros! Além desses pecadinhos (facilmente perdoados), temos linguagem contemporânea, excelência na escolha dos atores, na fotografia e nas belas paisagens. Sem final feliz. A direção dos irmãos Cohen tem seu mérito.

Mattie Ross (Hailee Steinfeld) sai em busca de vingança pela morte de seu pai, assassinado e roubado por Tom Chaney (Josh Brolin). Ela, então, contrata o xerife Rooster Gogburn (Jeff Bridges), analfabeto, cachaceiro e bom no gatilho para ajudá-la. E contará ainda com outra parceria, a do policial texano Labeouf (Matt Damon), que também busca o mesmo bandido por outro crime. Esta presença acrescenta aventura e suspense. Trata-se de uma boa história cheia de surpresas.

Esse projeto é motivado pela sede de justiça e honra que move o mundo do faroeste e de Mattie (a heroína). Ela confessa à mãe em carta: “Estou prestes a embarcar em uma grande aventura.” Sua decisão é destemida: ela se prepara para o desafio de ser forte para vencer os obstáculos.

Pronto! Temos o cenário para fatos heroicos, mesmo percebendo que o comportamento da Mattie nada tem a ver com sua idade, nem com o que se espera de uma mulher daquela época. Ela se prepara para um embate investida de heroína.

Ao olhar seu pai no caixão, diz “O espírito já se foi”. E passa para o próximo tópico, sem titubear. Compra um cavalo, toma da arma, agasalho e chapéu que são heranças do pai. Assim, se faz cavaleira, acrescentada desses símbolos do mundo do faroeste, que exige um preparo para o confronto com muitos inimigos até que se chegue ao destino.

Mattie, desde então, passa a representar o tipo de guerreiro que protege a honra e vem cheia de integridade, coragem e virtude. Com gestos comedidos, realiza a luta pela honra e defesa do bem. Uma heroína típica no mundo do faroeste.

Investida nesse papel, invoca a justiça legalmente estabelecida, ainda que saiba de antemão, que advogados podem não lhe valer muito nesse mundo hostil de limites pouco delicados. Abre mão de conforto, não se deixa levar por emoções, conta com os privilégios das informações e conhecimento que detém. Age em nome de uma ordem moral, em busca de justiça.

Escolhe o parceiro por ser o “mais cruel” e por averiguar de sobra suas qualidades: objetividade, astúcia, inteligência. A figura de Cogburn apresenta a natureza bruta, mas objetiva e honesta.

Através do encontro dos três personagens (Mattie, e os dois homens contratados) temos os eventos típicos desse tido de narrativa: assaltos, provocações, insultos, violência, assassinatos. É como se desenha a briga pela sobrevivência em um mundo ausente de leis, questão de vida ou morte, em que astúcia e estratégia são necessárias na defesa pela vida. Qual dos três é mais herói e o de mais bravura?

DESENLACE

Mas, o relacionamento entre as três personagens centrais pouco a pouco vai mudando. Da situação inicial de contínuo confronto, constrói-se uma situação de dependência em que os vínculos acabam se fazendo.

Este filme não é o mesmo faroeste dos anos quarenta e cinquenta. Nessa fase teríamos tido o seu auge? Mas, alguns de seus elementos se mantêm, como por exemplo, o caráter heroico e a dureza dos embates. E também outros sinais típicos do gênero, como pudemos observar. Neste filme, a narrativa é moderna acrescida por certa ironia e humor dos diretores.

O encaminhamento para o final da narrativa empresta verossimilhança às personagens, principalmente a feminina, que permanece solteira: “Não tive tempo para essas coisas”, confessa. Continuou pela vida em papéis masculinos, como a defesa da família?

E cabem duas questões: Por tudo o que ocorre na história, será essa a personagem principal que pode carregar o título do filme? Ou será o xerife, que como bom personagem de faroeste, tem a marca da solidão e da força para uma vida à margem? Pode ser o xerife, pode ser a Mattie. Vale a polêmica.

E por último, nesse mundo de xerifes, bandidos e personagens solitárias, podemos chamar seus “mocinhos” de heróis? O cenário e a roupa mudam, mas não serão eles muito afins de tudo o que corresponde ao mundo dos nossos heróis de hoje em dia?

Então, vejamos. Temos o terreno do lúdico, das narrativas que desde sempre juntaram homens em volta das fogueiras ou nas calçadas para causos de toda a espécie. Aventuras e desafios que nos tiram das repetições cotidianas e nos inspiram a gestos e atos de coragem. Ao lado do básico, enfadonho exercício da vida, temos outros limites.

Como denominá-los? Frutos da imaginação, sempre necessária para completar o básico? Frutos do espiritual para dar sentido maior a nossos gestos de vida? Talvez, haja mais.

A partir deles, mobilizamos recursos da nossa natureza humana que nos elevam a limites mágicos. E eles são representados pelos mocinhos e herois de tantos tipos e tempos.

Vida longa a eles todos!

 

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